Antes de a Lei Maria da Penha entrar em vigor, a violência doméstica e familiar contra a mulher era tratada como crime de menor potencial ofensivo e enquadrada na Lei n. 9.099/1995.
Na prática, isso significava que a violência de gênero era banalizada e as penas geralmente se reduziam ao pagamento de cestas básicas ou trabalhos comunitários. Em outras palavras, não havia dispositivo legal para punir, com mais rigor, o homem autor de violência.
Para se ter uma ideia do que acontecia, após denunciar o agressor, a vítima ainda tinha que levar a intimação para que ele comparecesse perante o delegado. Isso mostra o descaso e a falta de sensibilidade com que esse problema era tratado.
Por isso, para o Consórcio de ONGs que participou da criação da Lei Maria da Penha, era fundamental desvincular a nova lei da Lei n. 9.099/1995. Havia a necessidade de mudar esse cenário e, após pouco mais de quatro anos de muito debate com o Executivo, o Legislativo e a sociedade civil, a Lei Maria da Penha foi sancionada em 7 de agosto de 2006.
Com a LMP, a violência doméstica e familiar contra a mulher passa a ser crime, deixando de ser tratada como de menor potencial ofensivo. A lei também estabelece a definição do que é a violência doméstica e familiar, bem como caracteriza as suas formas: física, psicológica, sexual, patrimonial e moral. Além disso, a Lei n. 11.340/2006 cria mecanismos de proteção às vítimas, assumindo que a violência de gênero contra a mulher é uma responsabilidade do Estado brasileiro, e não apenas uma questão familiar.
Segundo o art. 6º da Lei Maria da Penha, “a violência doméstica e familiar contra a mulher constitui uma das formas de violação dos direitos humanos”, dispositivo fundamental para desvincular esse tipo de crime da Lei n. 9.099/1995, a qual o considerava como de menor potencial ofensivo. Ao assumir essa perspectiva, a lei atende a inúmeros tratados assinados pelo Estado brasileiro, tais como a Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra a Mulher (CEDAW); a Declaração e Plataforma de Ação da IV Conferência Mundial sobre a Mulher; a Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência contra a Mulher (Convenção de Belém do Pará); e a Convenção Americana sobre os Direitos Humanos (Pacto de San José da Costa Rica), entre outros.
É importante que se diga que a Lei Maria da Penha não pode ser tratada apenas como uma via jurídica para se punir os agressores. Isso porque ela também traz em seu texto o conceito de todos os tipos de violência doméstica e familiar; insere a criação de políticas públicas de prevenção, assistência e proteção às vítimas; prevê a instituição de Juizados de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher; institui as medidas protetivas de urgência; e estabelece a promoção de programas educacionais com perspectiva de gênero, raça e etnia, entre outras propostas. Todos esses dispositivos intensificam uma rede integrada de enfrentamento à violência doméstica e familiar contra a mulher, além de atenderem às recomendações da Comissão Interamericana de Direitos Humanos para o caso Maria da Penha Maia Fernandes. Mais do que uma alteração da legislação penal, a Lei n. 11.340/2006 representa um importante instrumento legal de proteção aos direitos humanos das mulheres para uma vida livre de violência.
Além de proteger mulheres em situação de violência e salvar vidas, a Lei n. 11.340/2006 pune os agressores, fortalece a autonomia das mulheres, educa a sociedade e cria meios de assistência e atendimento humanizado, bem como inclui valores de direitos humanos nas políticas públicas para o enfrentamento e combate à violência de gênero.
A Lei 11.340/2006 Maria da Penha na Integra
Instituto Maria da Penha
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